Monday, October 13, 2008

Filme 5/52: O Escafandro e a Borboleta

Le Scaphandre et le papillon
D:Julian Schnabel
F:Janusz Kaminski
R:Ronald Harwood baseado no livro de Jean-Dominique Bauby
http://www.imdb.com/title/tt0401383/


Filmes são diferentes de livros. Não há como negar. Acho que mesmo cineastas enquanto espectadores reconhecem isto. Mas há muito poucos cineastas que, enquanto cineastas, conseguem entender esta diferença e fazer bons filmes a partir de bons livros.

Julian Schnabel é um destes poucos, e "Le Scaphandre et le papillon" é uma destas boas versões. O filme é baseado na autobiografia de Jean-Dominique Bauby, editor da revista Elle francesa que após um repentino derrame se encontra preso dentro de si mesmo, 100% consciente mas incapaz de mover qualquer músculo a não ser sua pálpebra esquerda.

Os especialistas chamam de "sindrome de locked-in", traduzida por Jean-Dominique como a esperiência de se estar preso e imóvel em um escafandro que flutua pela vida, descrição perfeita do que vivemos nós, os espectadores ao assistir ao filme.

O diretor Julian Schnabel segue o caminho ditado pelo livro (que mais tarde descobrimos ter sido ditado pela pálpebra do protagonista) ao contar o filme em 1a pessoa e acerta em cheio quando decide não colocar Jean-Do como um pobre diabo, mas sim prender a platéia dentro de seu corpo e assim nos colocar na completa e desesperadora imobilidade da síndrome, só quebrada pelas piscadas e ótimas tiradas de humor negro do próprio autor-paciente.

Num primeiro momento o filme é apenas incômodo mas, assim como seu narrador, vamos nos acostumando, entre uma angústia e outra, entre uma tirada cômica e mais alguma descoberta da vida pré-acidente do escafandrista. Após muitos pensamentos que só nós escutamos, uma fonoaudióloga desenvolve um método que permite que o paciente vá soletrando palavras piscando quando a letra é dita por ela. Para nós espectadores que vamos piscando letra a letra para as enfermeiras não há nada mais sufocante.

O filme é angustiante, a situação de Jean-Do dramática, mas o que torna o filme forte são as relações humanas que ele reavalia. Se você se encontrasse preso em seu corpo com um último fio de comunicação com o exterior, qual seria seu último texto ao mundo? Escreveria cartas a seu pai? Escreveria um livro de auto-ajuda?

Para mim o filme é muito bom primeiro pelo fato de se saber filme, segundo pelo fato de nos tocar pela identificação com os defeitos e angústias, e não por qualquer tipo de caridade cristã, e por fim, por ser um filme simples porém belo, por ser bem executado sem precisar dar muitas piruetas.

Pode ser ato-reflexo, quase óbvio-ululante, mas é impossível não perguntar, não estaremos todos nos afogando dentro de nossos escafandros?