Thursday, May 31, 2007

A praxis se subverte em nós


Na volta para casa, ida para o teatro, o telefone tocando. Tinha combinado com vários de nos encontrarmos em casa, mas o trânsito da Bandeirantes não colaborava e eu estava preocupado que alguém estivesse à porta de casa me esperado. Droga. Não teria pego este trânsito se tivesse ido pela Ricardo Jafet, meu caminho usual.

Vou conversando com o gerente. Vamos discutindo problemas do projeto, pessoas que têm ou não boa postura. Recebo elogios: "O Petroni. O Petroni me perguntou de você e eu disse como você estava indo bem. Não tenho mais dúvidas..." Só um segundo, tenho que atender, alô? Oi Si, onde ce tá? Ah tá, eu também estou enrolado, o trânsito está um horror. Desculpe Jorge, você dizia? "Então, o Petroni, falei pra ele que na minha opinião você será o gerente da continuação do projeto. Definitivamente é você. Foi o que eu disse para ele." Não dei muita atenção para os elogios, voltamos a discutir os riscos que temos que mitigar, processos para aumentar a eficiência.

Abraço, até amanhã. Me despedi ao deixá-lo no hotel. Toca novamente o celular. Alo? oi, então, o trânsito está foda, to a caminho, vamos juntos. Você passa e me pega? Estou bem pertinho de lá. Beijo até.

Caralho, faz duas semanas que tento anotar meus sonhos, mas só sonho com o projeto, o que falta fazer, com quem tenho que falar. Esses dias sonhei com a solução para uma arquitetura que há dias tentávamos fechar. Bom, mas pelo menos tô me sentindo super disposto a isto. Já é um progresso.

Chego em casa, abro a revista que comprei, toca o celular. Que? já estão aqui? tá, tô descendo. Não querem subir? Termino de ler a entrevista e pego o elevador.

A peça é mais um show do que peça, o teatro é mais um bar que um teatro e eu demoro a prestar atenção. Sinto-me muito bem. Sinto-me rápido nas respostas, com respostas engraçadas e afiadas. Mas não me sinto muito no clima do show.

O show começa. Não é que eles cantem mal, mas o som está horrível, o palco fica numa área separada do bar, mas a porta que liga as duas partes está aberta, o microfone dela está com mal contato. Cantam. Ela atua. Ele atua. "Mais uma cerveja?"

Os dois são muito feios. Ele é magrelo e tem a cabeça alongada, um pouco desproporcional para o corpo. Tem orelhas e nariz grandes, com o olho levemente estrábico, com um olho fungindo-lhe ao controle de tempos em tempos.

Ela é meio gordinha, vestida de vedete, nariz pontiagudo e dentes da frente separados. Não é que atuem mal, mas é como se toda a sensibilidade, frases de amor que intercalam as canções do Chico não me atingissem. É como se elas errassem o alvo. São setas que desviam em minha bolha de eficiência.

Depois de algum tempo começo a me dar conta. Começo a perceber o fundo que está minha sensibilidade. Começo a perceber o como são lindamente ineficientes os artistas. Como são lindamente desorganizados, e como erram sem medo. Ela não tem o menor medo de parecer ridícula. Ela não teme que digam a ela que sua atuação não diz nada. Ele é gay e força-se a beijá-la. Misturam Drummond, Bernard Shaw e Chico. Falam de amor sem falar em Vinícius. Cortaram a música do Chico, o "casamento dos Pequenos Burgueses" virou uma piadinha do Nelson Rodrigues. Decadência. Como é bela e autêntica a decadência da arte no centro da cidade. Ela está linda, entre as cabeças da mesa da frente, com as luzes refletindo em minha mesa. Onde está minha câmera?

E assim, numa peça de teatro que é show, em um teatro que é bar, choro ao ver a beleza desta decadência com a força poética de uma puta triste fumando um cigarro ao lado do cartaz da Elis. Vamos? enxugo o rosto. Tenho que trabalhar amanhã.

A praxis se subverte em nós.

Monday, May 28, 2007

O Fingidor

Haverá algo pior que ser fingidor sem ser poeta?
Tomo caminhos mais longos antes de voltar à minha sozinhêz.
Pelas ruas noturnas desta metrópole, procuro, sem muita lucidez
uma resposta, em algum canto escuro uma porta aberta.

Um bar barato, aleatório, sem charme algum, esperança vã
Se arriscar e encontrar alguém sozinha alguém perdida
Que esteja ali, neste improvável bar, com um xale de lã
fora da moda a esperar um café, um oi, uma despedida

Em casa, poemas lidos e relidos, cigarros caros e inofensivos.
Textos simples demenos, rápidos demais para um sentir que é lento.
É fruto de uma vida enclausurada nesta camisa-de-força de vento,
deste lamentar do passado, e não-quereres de futuros noscivos.

Queria eu ser poeta, jogar-me aos dados,
sem sonhar, sem pensar, quaisquer que sejam os fados.

Monday, May 21, 2007

Sei lá

Sei lá.
Esses dias, um dia desses, acordei achando
que valia a pena vencer a mim mesmo, mesmo vacilando
que isto seria não mudar nada, ou pior, que seria ser capitão
de um encouraçado que serve carne podre aos marinheiros no porão.

Sei lá.
o que sou eu, sei que não concordo, sei o que sei, sei de onde saí,
sei que nada sei, só não sei o que eu sei, se a via crucis virou circo estou aqui.

Sei lá.