Wednesday, July 23, 2008

Filme 3/52: Batman - O Cavaleiro das Trevas

Batman - O Cavaleiro das Trevas
D: Christopher Nolan
F: Wally Pfister
R: Jonathan Nolan e Christopher Nolan
http://www.imdb.com/title/tt0468569/

Adoro quando acontece isto com filmes. Um mega-blockbuster do qual eu estava completamente alheio da existência aparece em minha frente e, sem quase nenhuma informação eu entro na sala de cinema e dou de cara com uma obra absolutamente fantástica. A última vez que isto aconteceu (faz tempo..) foi com o Matrix.

"O Cavaleiro das Trevas" é um daqueles filmes que conseguem unir um roteiro incrível, atuações absolutamente geniais com cenas de ação competentes. É pra se divertir por 3 horas e ficar digerindo por 3 dias.

A fotografia do filme é interessantíssima, mais do que escura ela é sombria. Li em algum lugar que foram escurecidas as bordas do filme para dar este efeito. A arte do filme, locações, figurinos, objetos de cena é toda muito bem cuidada, som, fotografia, tudo com a qualidade que os bons filmes de hollywood costumam oferecer, mais a vida inteligente que o cinemão não costuma cultivar.

Como em qualquer Batman, o vilão rouba a cena. Mas desta vez é diferente. O Coringa de Heath Ledger é definitivo, parece saltar diretamente dos quadrinhos e sua personalidade caótica e psicopática representa tudo que o coringa tem que representar, a destruição de todas as instituições que fragilmente sustentam a sociedade gothamcityense.
O Coringa é o bobo da corte, ele está ali para desmistificar e ridicularizar qualquer valor grandioso ou universal e para tornar toda e qualquer verdade em algo relativo, momentâneo e dialético. A verdade e a justiça, criações humanas não são entidades absolutas nunca, elas são culturais e históricas.

O mundo inatista herdado de "Batman Begins" não entende isto de cara, e tanto o Homem-Morcego quanto os bandidos comuns lidam com ele como se ele fosse motivado pelos óbvios dinheiro e poder e vão um a um se perdendo e caindo em uma armadilha após a outra. Enquanto isto, vemos o Coringa queimar uma pilha enorme de dinheiro, vemos ele quebrar com a suposta compaixão humana da democracia quando a população vota matar os presidiários e os presidiários descartam matar a população. Pouco a pouco vemos as outras personagens irem fugindo de seu script e irem relativizando suas verdades e valores. Batman invade a privacidade de todos os moradores de Gotham, "contamina" a cena do crime sobrepassando o CSI, tortura o coringa para extrair informações e confirma a profecia do coringa quando fala "nós somos a mesma pessoa, você me complementa".

A fala do Coringa é ainda mais significativa pois ele diz isto enquanto está pendurado por uma corda amarrada no pé, referência direta à carta do Enforcado no Tarô, que segundo a Wikipedia tem o seguinte significado: "Serenely dangling upside-down, the Hanged Man has let go of worldly attachments. He has sacrificed a desire for control over his circumstances in order to gain an understanding of, and communion with, creative energies far greater than his individual self. In letting go, the hero gains a profound perspective accessible only to someone free from everyday conceptual, dualistic reality." De forma genial, a cena começa com o Coringa de cabeça para baixo, e a câmera vira, criando uma carta do baralho virtual e colocando ele, apesar de pendurado, na mesma posição que seu inimigo-complemento, o homem-morcego.

NO Cavaleiro das Trevas, Batman deixa de ser o arquétipo do herói para enfrentar o mundo, romper com seus paradigmas e dar uma dimensão mutio mais ampla ao mundo fora da dicotomia (ironicamente típica de hollywood) do bem e do mal. É claro que ao final do filme ele é apenas um herói confuso e confundido com um vilão pela cidade que ele se sacrifica para salvar. Ele é "o herói que Gotham merece".

Esta revisão é mais clara e presente no Batman, mas quase todas as personagens rompem com todas as suas verdades em nome de alguma circunstância muito mais habilmente entendida pelo Vilão. Harvey Dent, o protótipo do herói institucionalizado, legitimado pelo sistema, vira o duas faces, Lucius, o inventor dos bat-apetrechos é cumplice da violação de privacidade da população pelo batman (só desta vez, nunca mais!), Alfred escolhe não mostrar a carta com as verdades a Bruce Waine e a queima, Gordon é forçado a mentir para o filho e assume a culpa que não tem para salvá-lo (e aí a única instituição não estilhaçada no filme, a família), até a policial da equipe de Gordon mente para a Sra Gordon com uma arma apontada na cabeça.

Enfim, este é um filme do Batman onde ninguém é totalmente bom, e nos torna cúmplices da corrupção de caráter a que as personagens vão sendo submetidas. São questionados os conceitos de razão, verdade, justiça e democracia numa obra onde o coringa é o mestre de cerimônias deste comboio de corda que se chama coração.

A tempo: a vida imita (complementa?) a arte, Heath foi encontrado morto em NY em circunstâncias estranhas, onde se cogita suicídio. Christian Bale, o Batman, foi preso em londres por agredir a mulher e filha. A verdade e a justiça são processos realmente culturais meus amigos...

1 comment:

  1. Gu,
    Adorei a sua crítica, texto, o q vc preferir, principalmente a parte sobre o tarô e a sociedade "gothamcityense"!!
    O filme é realmente muito bom e faz pensar em vários conceitos mesmo...Um batman para gente grande! rsrs
    bjos
    Camis

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